quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

DO MEIO NATURAL AO MEIO TÉCNICO-CIENTÍFICO E INFORMACIONAL

                           INTRODUÇÃO
          A história das chamadas relações entre sociedade e natureza é, em todos os lugares habitados, a da substituição de um meio natural, dado a uma determinada sociedade, por um meio cada vez mais artificializado, isto é, sucessivamente instrumentalizado por essa mesma sociedade. Em cada fração da superfície da terra, o caminho que vai de uma situação a outra se dá de maneira particular; e aparte do ‘’natural’’e do ‘’artificial’’ também varia, assim como mudam as modalidades do seu arranjo.
          Podemos admitir que a história do meio geográfico pode s er grosseiramente dividida em três etapas: o meio natural, o meio técnico, o meio técnico-científico-informacional.
Alguns autores preferirão falar de meio pré-técnico em lugar de meio natural. Mas a própria idéia de meio geográfico é inseparável da noção de técnica. Para S. Moscovici (1968), as condições do trabalho estão em relação direta com um modo particular de constituição da natureza (citado por Busino, 1991, p. 73) e a inexistência de artefatos mais complexos ou de máquinas não significa que uma dada sociedade não disponha de técnicas. Estamos, porém, reservando a apelação de meio técnico à fase posterior à invenção e ao uso das máquinas, já que estas, unidas ao solo, dão uma toda nova dimensão à respectiva geog rafia. Quanto ao meio técnico-científico-informacional é o meio geográfico do período atual, onde os objetos mais proeminentes são elaborados a partir dos mandamentos da ciência e se servem de uma técnica informacional da qual lhes vem o alto coeficiente de intencionalidade com que servem às diversas modalidades e às diversas etapas da produção.
O MEIO NATURAL
          Quando tudo era meio natural, o homem escolhia da natureza aquelas suas partes ou aspectos considerados fundamentais ao exercício da vida, valorizando, diferentemente, segundo os lugares e as culturas, essas condições naturais que constituíam a base material da existência do grupo.
          Esse meio natural generalizado era utilizado pelo homem sem grandes transformações. As técnicas e o trabalho se casavam com as dádivas da natureza, com a qual se relacionavam sem outra mediação.O que alguns consideram como período pré-técnico exclui uma definição restritiva. As transformações impostas às coisas naturais já eram técnicas, entre as quais a domesticação de plantas e animais aparece como um momento marcante: o homem mudando a Natureza, impondo-lhe leis. A isso também se chama técnica.Nesse período, os sistemas técnicos não tinham existência autônoma. Sua simbiose com a natureza resultante era total (G. Berger, 1964, p. 231; P. George, 1974, pp. 24 e 26) e podemos dizer, talvez, que o possibilismo da criação mergulhava no determinismo do funcionamento. As motivações de uso eram, sobretudo, locais, ainda que os papéis do intercâmbio nas determinações sociais pudessem ser crescentes. Assim, a sociedade local era, ao mesmo tempo, criadora das técnicas utilizadas, comandante dos tempos sociais e dos limites de sua utilização. A harmonia socioespacial assim estabelecida era, desse modo, respeitosa da natureza herdada, no processo de criação de uma nova natureza. Produzindo-a, a sociedade territorial produzia, também, uma série de comportamentos, cuja razão é a preservação e a continuidade do meio de vida. Exemplo disso são, entre outros, o pousio, a rotação de terras, a agricultura itinerante, que constituem, ao mesmo tempo, regras sociais e regras territoriais, tendentes a conciliar o uso e a ‘’conservação’’ da natureza: para que ela possa ser, outra vez, utilizada. Esses sistemas técnicos sem objetos técnicos não eram, pois, agressivos, pelo fato de serem indissolúveis em relação à Natureza que, em sua operação, ajudavam a reconstituir.

O MEIO TÉCNICO
          O período técnico vê a emergência do espaço mecanizado. Os objetos que formam o meio não são, apenas, objetos culturais; eles são culturais e técnicos, ao mesmo tempo. Quanto ao espaço, o componente material é crescentemente formado do ‘’natural’’ e do ‘’artificial’’. Mas o número e a qualidade de artefatos varia. As áreas, os espaços, as regiões, os países passam a se distinguir em função da extensão e da densidade da substituição, neles, dos objetos naturais e dos objetos culturais, por objetos técnicos.Os objetos técnicos, maquínicos, juntam à razão natural sua própria razão, uma lógica instrumental que desafia as lógicas naturais, criando, nos lugares atingidos, mistos ou híbridos conflitivos. Os objetos técnicos e o espaço maquinizado são locus de ações ‘’superiores’’, graças à sua superposição triunfante às forças naturais. Tais ações são, também, consideradas superiores pela crença de que ao homem atribuem novos poderes - o maior dos quais é a prerrogativa de enfrentar a Natureza, natural ou já socializada, vinda do período anterior, com instrumentos que já não são prolongamento do seu corpo, mas que representam prolongamentos do território, verdadeiras próteses. Utilizando novos materiais e transgredindo a distância, o homem começa a fabricar um tempo novo, no trabalho, no intercâmbio, no lar. Os tempos sociais tendem a se superpor e contrapor aos tempos naturais. O componente internacional da divisão do trabalho tende a aumentar exponencialmente. Assim, as motivações de uso dos sistemas técnicos são crescentemente estranhas às lógicas locais e, mesmo, nacionais; e a impor tância da troca na sobrevivência do grupo também cresce. Como o êxito, nesse processo de comércio, depende, em grande parte, da presença de sistemas técnicos eficazes, estes acabam por ser cada vez mais presentes. A razão do comércio, e não a razão da natureza, é que preside à sua instalação. Em outras palavras, sua presença torna-se crescentemente indiferente às condições preexistentes. A poluição e outras ofensas ambientais ainda não tinham esse nome, mas já são largamente notadas -e causticadas -no século XIX, nas grandes cidades inglesas e continentais. E a própria chegada ao campo das estradas de ferro suscita protesto. A reação antimaquinista, protagonizada pelos diversos ludismos, antecipa a batalha atual dos ambientalistas. Esse era, então, o combate social contra os miasmas urbanos.
          O fenômeno, porém, era limitado. Eram poucos os países e regiões em que o progresso técnico podia instalar-se. E, mesmo nestes poucos, os sistemas técnicos vigentes eram geograficamente circunscritos, de modo que tanto seus efeitos estavam longe de ser generalizados, como a visão desses efeitos era, igualmente, limitada

O MEIO TÉCNICO-CIENTÍFICO E INFORMACIONAL
          Ganha importância crescente o fragmentado, a descontinuidade, a sobreposição de combinações em tempo real que desafiam padrões ao mesmo tempo que acenam com novos controles. O que tem a Geografia a dizer sobre a Internet? As análises atuais mostram como o meio técnico-científico resulta de um processo de mudança acelerado, em que uma nova forma de produção - baseada na informação e no conhecimento - está redefinindo as relações de poder no planeta. Tornou-se um imperativo dispor, cada vez mais rapidamente, de informações (em quantidade e qualidade). Graças à explosão das telecomunicações, uma nova geografia das redes se afirma - a informação se tornou cada vez mais uma mercadoria de compra e venda, e a organização social e territorial da informação está sofrendo transformações profundas nos dias atuais. Uma das realidades mais extraordinárias do mundo atual é a velocidade com que são transmitidas informações entre diferentes lugares, quer estejam próximos quer distantes, fazendo deles lugares mundiais. A comunicação e a circulação de informações - dados, idéias ou decisões - ocorrem instantaneamente, no chamado tempo zero. Isso sem falar que essas informações podem chegar, ao mesmo tempo, em vários lugares. Velocidade, instantaneidade e simultaneidade são características do que chamamos de meio técnico-científico informacional.
          Para Milton Santos, a ciência, a tecnologia e a informação, hoje, são a base técnica da vida social, ou, em outras palavras, o meio técnico-científico informacional é um meio geográfico no qual o território inclui obrigatoriamente ciência, tecnologia e informação.Nas últimas décadas, a revolução tecno-científica em curso se deu destacadamente no campo da microeletrônica e das telecomunicações, e ocorreu juntamente com a reestruturação da produção e do trabalho no sistema capitalista, da economia internacional e dos territórios. A alta tecnologia permitiu a crescente internacionalização da economia e a interpenetração das economias nacionais, ou seja, a interpenetração do capital, do trabalho, dos mercados e dos processos de produção baseados na informação. E, com isso, países e nações deixam de ser unidades econômicas de nossa realidade histórica. A economia capitalista, dominante no mundo, estimula a competição econômica e força as empresas - principalmente as de grande porte - a buscarem a eficácia, gerando com isso uma sucessiva revolução do trabalho, da técnica e dos produtos. Sistemas cada vez mais aperfeiçoados de comunicação e de fluxos de informações, junto com técnicas mais racionais de distribuição, tais como empacotamento, controle de estoques e conteinerização, permitem a aceleração das atividades e da circulação de mercadorias. Bancos eletrônicos e dinheiro "de plástico" são inovações que agilizam os fluxos de dinheiro e permitem a aceleração dos negócios nos mercados financeiros e de serviços, tanto nacionais como internacionais.
          A economia de mercado sempre buscou a redução das distâncias porque isso significaria redução do tempo de produção, de circulação e de consumo de mercadorias e, conseqüentemente, redução dos custos, pois, no sistema capitalista de produção, tempo é dinheiro. Grandes avanços foram feitos nesse sentido, ao longo do século XIX e na primeira metade do século XX. Eram inovações voltadas para a remoção das barreiras espaciais - uma questão "deveras geográfica" na história das sociedades capitalistas.
          Foi isso que aconteceu quando surgiram as estradas de ferro, o cabo submarino, o telégrafo sem fio, o automóvel, o telefone, o rádio, o avião a jato e a televisão que, ao formarem redes técnicas de circulação e comunicação, permitiram (cada um a seu tempo e interligando-se aos demais) realizar integrações territoriais, quebrando as barreiras físicas para o transporte e para a circulação de matérias-primas, de bens produzidos, de pessoas, de idéias, de decisões e de capital. Mas nenhuma dessas inovações comprimiu tanto o espaço, acelerando o processo de integração, como as novas tecnologias da informação.Hoje ocorre um aumento significativo na densidade das redes de circulação e de comunicação. E essas redes podem se superpor umas às outras, permitindo simultaneamente a aceleração nos processos de integração produtiva, integração de mercados, integração financeira, integração de informações. Mas, ao mesmo tempo e perversamente, geram um processo de desintegração, pelo qual países e nações são excluídos das vantagens propiciadas pela alta tecnologia da informática, como ocorre, notadamente, com nações africanas.
          No entanto, a exclusão não se dá apenas em relação às nações mais pobres. Tal exclusão atinge também milhões de trabalhadores nas economias de tecnologia mais avançada. Em países desenvolvidos, máquinas inteligentes estão substituindo trabalhadores de escritórios e operários que, a cada dia, engrossam as filas dos desempregados.
         Podemos então deduzir que a tecnologia é um fator importante, mas ela, por si só, não explica a História dos homens.
 

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A PAISAGEM NA GEOGRAFIA II

            É comum encontrar pessoas que pensam que saber Geografia é aprender muitos dados, saber qual é população de todas as cidades do mundo e poder citar e localizar todos os novos Estados africanos. Algumas pessoas acham que a Geografia tem a ver com os mapas e também com a descrição de viagens pelo mundo.
           Cada uma dessas crenças populares tem algo de verdadeiro. A localização, os dados e os mapas são recursos que a Geografia utiliza, recursos esses que geram a habilidade de “olhar geograficamente ”, isto é, a capacidade de observar e interpretar os distintos processos naturais e sociais, tanto diretamente na realidade, como por meio de mapas, fotos aéreas, imagens de satélites e outras representações do mundo real.
          A observação e a interpretação da fisionomia da paisagem - que é a porção do lugar que a vista alcança - faz parte da essência do saber da Geografia.
         Olhar e pensar sobre o que está presente em cada rua de sua cidade, em cada campo plantado, em cada montanha ou floresta pode ajudar a compreender como natureza e a sociedade se combinam para moldar as diferentes formas que existem na superfície da Terra.
          A noção de paisagem, para a Geografia, não deve ser confundida com a do paisagismo, que está ligada a uma concepção de estética na distribuição de objetos em um jardim ou um parque. Para a ciência geográfica, a paisagem deve ser entendida como indicadora de conteúdo vivo e de processos dinâmicos, isto é, em constante transformação.
           A interpretação da paisagem para a Geografia é a busca da explicação científica de como as formas que observamos são o resultado visível da combinação de processos físicos, biológicos e humanos ou antrópicos (do grego antropos = homem). Percebida por intermédio de uma visão científica, a paisagem ganha uma abordagem com características próprias de um método de pesquisa. Assim, o estudo da paisagem se constitui num dos mais antigos métodos de estudo pertencentes à Geografia.
          Em cada lugar da superfície terrestre, as condições de vida são o resultado de uma interação dos distintos elementos naturais, trabalhados pela atividade humana, com maior ou menor intensidade. Mesmo na Antártida, onde as condições inóspitas de clima dificultam o estabelecimento permanente do homem, as marcas de sua atividade estão presentes no buraco da camada de ozônio que altera as condições naturais do continente gelado.
            Porém, independentemente da ação humana, podemos afirmar que as paisagens são também produtos das mais diversas combinações de fenômenos naturais, que apresentam sua própria diversidade, a exemplo do relevo, que aparece em distintas formas e dimensões.   
Essas formas diferentes de relevo contribuem para criar diferentes paisagens de montanhas ou planaltos.
           Por sua vez, as condições climáticas são determinantes para a diversidade das formações vegetais e para o processo de formação dos solos. O clima também está presente nos distintos agentes de erosão, a exemplo das chuvas ou do vento.
Por isso, também é responsável pela modelagem do relevo. Assim, os diferentes processos físicos e biológicos interagem mutuamente na formação do que se chama substrato natural da paisagem.
          Por causa das atividades humanas, a paisagem natural vai sofrendo múltiplas modificações no decorrer do tempo, transformando-se numa paisagem humanizada, pela incorporação de elementos culturais.
          De acordo com a atividade predominante da população de um lugar, vão se estruturando paisagens de diferentes características, segundo os graus de transformação dos elementos naturais, e conforme a intensidade e a orientação da atividade humana. Desse modo, podemos diferenciar paisagens agrícolas, minerais, industriais e urbanas.
           O maior impacto das atividades humanas está presente na paisagem urbana, que é o produto de atividades ligadas à indústria, ao comércio e ao serviço. Isso mostra que a paisagem não é dada para todo o sempre, mas que é objeto de mudança permanente.

Favela dos Alagados - Salvador / Bahia
            É nas cidades que melhor podemos observar a dinâmica da paisagem, dada a velocidade das transformações que ocorrem no espaço urbano.           A cidade é uma espécie museu vivo da história do trabalho e das técnicas desenvolvidas pela sociedade. Casas antigas e modernas, ruas com grandes edifícios comerciais ou pequenas vilas, praças e monumentos mostram que o trabalho humano se incorpora ao espaço em que vivemos, o qual está em constante transformação. Pode-se dizer, então, que as paisagens são como as fotografias que refletem as combinações entre processos naturais e sociais em um espaço geográfico, no decorrer do tempo histórico.
           Existem na paisagem indicações muito claras dos processos sociais que as moldam. Um bairro pobre de uma cidade reflete desigualdade social na apropriação da renda, evidenciada nas ruas sem calçamento, nas praças abandonadas, nas valas abertas por onde correm os esgotos.
          Se soubermos observar e interpretar a paisagem, isso permitirá que tenhamos uma concepção de como o lugar que ocupamos no espaço geográfico é o resultado das condições sociais em que vivemos.
Paisagem e espaço não são sinônimos. A paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem as heranças que representam sucessivas relações localizadas entre a sociedade e a natureza. O espaço são essas formas mais a vida que as anima.
          O espaço é a sociedade, e a paisagem também o é. No entanto, entre o espaço e paisagem o acordo não é total, e a busca desse acordo é permanente; essa busca nunca chega a um fim.
          A paisagem existe, através de suas formas, criadas em momentos históricos diferentes, porém coexistindo no momento atual. No espaço as formas de que se compõe a paisagem preenchem, no momento atual, uma função atual, como resposta às necessidades atuais da sociedade. Tais formas nasceram sob diferentes necessidades, emanaram de sociedades sucessivas, mas só as formas mais recentes correspondem a determinações da sociedade atual.
         O espaço não pode ser estudado como se os objetos materiais que formam a paisagem tivessem uma vida própria, podendo assim explicar-se por si mesmos. Sem dúvida, as formas são importantes. Essa materialidade sobrevive aos modos de produção. Mas, como lembra Baudrillard (1973, p. 16), “a única coisa que nos dá conta do real não são as estruturas coerentes da técnica, mas as modalidades de incidência das práticas sobre as técnicas ou, mais exatamente, as modalidades de obstrução das técnicas pelas práticas”.
          Só por sua presença, os objetos técnicos não têm outro significado senão o paisagístico. Mas eles aí também estão em disponibilidade, à espera de um conteúdo social. Marx já dizia que “a economia política não é a tecnologia” (Grundrisse, Caderno M.). Se o homem, por seu trabalho –– enquanto produtor, residente ou ocupante ocasional ­­–– não transmite vida à coisa, essa vida da qual somente ele é detentor, o objeto permanecerá sempre como tecnologia, e não como economia, assim como as forças materiais naturais não se tornam produtivas senão pelo trabalho humano, no dizer de Jakubowsky (1971, p. 60), o mesmo se passa com as forças materiais sociais , criadas um dia pelo homem mediante o processo da produção, presente ou passada .
          É a sociedade, isto é, o homem, que anima as forças espaciais, atribuindo-lhes um conteúdo, uma vida. Só a vida é passível desse processo infinito que vai do passado ao futuro, só ela tem o poder de tudo transformar amplamente, é capaz de um movimento próprio, mas não pode participar de nenhum movimento contraditório, de nenhuma dialética.
          Uma casa vazia ou um terreno baldio, um lago, uma floresta, uma montanha não participam do processo dialético se não porque lhes são atribuídos determinados valores, isto é, quando são transformados em espaço. O simples fato de existirem como formas, isto é, como paisagem, não basta. A forma já utilizada é coisa diferente, pois seu conteúdo é social. Ela se torna espaço, porque forma - conteúdo.
         Quando a sociedade age sobre o espaço, ela não o faz sobre os objetos como realidade física, mas como realidade social, formas-conteúdo, isto é, objetos sociais já valorizados aos quais ela (a sociedade) buscar oferecer ou impor um novo valor. A ação se dá sobre objetos já agidos, isto é, portadores de ações já concluídas, mas ainda presentes. Esses objetos de ação são, desse modo, dotados de uma presença humana e por ela qualificados.
         Em cada momento, em uma análise, a sociedade está agindo sobre ela própria, e jamais sobre a materialidade exclusiva. A dialética, pois, não é entre sociedade e paisagem, mas entre sociedade e espaço. E vice – versa.

Relação Sociedade-Natureza: do Meio Natural ao Meio Técnico-científico e Informacional

A PAISAGEM NA GEOGRAFIA
         É comum encontrar pessoas que pensam que saber Geografia é aprender muitos dados, saber qual é população de todas as cidades do mundo e poder citar e localizar todos os novos Estados africanos. Algumas pessoas acham que a Geografia tem a ver com os mapas e também com a descrição de viagens pelo mundo.
        Cada uma dessas crenças populares tem algo de verdadeiro. A localização, os dados e os mapas são recursos que a Geografia utiliza, recursos esses que geram a habilidade de “olhar geograficamente ”, isto é, a capacidade de observar e interpretar os distintos processos naturais e sociais, tanto diretamente na realidade, como por meio de mapas, fotos aéreas, imagens de satélites e outras representações do mundo real.
        A observação e a interpretação da fisionomia da paisagem - que é a porção do lugar que a vista alcança - faz parte da essência do saber da Geografia.
Olhar e pensar sobre o que está presente em cada rua de sua cidade, em cada campo plantado, em cada montanha ou floresta pode ajudar a compreender como natureza e a sociedade se combinam para moldar as diferentes formas que existem na superfície da Terra.
        A noção de paisagem, para a Geografia, não deve ser confundida com a do paisagismo, que está ligada a uma concepção de estética na distribuição de objetos em um jardim ou um parque. Para a ciência geográfica, a paisagem deve ser entendida como indicadora de conteúdo vivo e de processos dinâmicos, isto é, em constante transformação.
        A interpretação da paisagem para a Geografia é a busca da explicação científica de como as formas que observamos são o resultado visível da combinação de processos físicos, biológicos e humanos ou antrópicos (do grego antropos = homem). Percebida por intermédio de uma visão científica, a paisagem ganha uma abordagem com características próprias de um método de pesquisa. Assim, o estudo da paisagem se constitui num dos mais antigos métodos de estudo pertencentes à Geografia.
         Em cada lugar da superfície terrestre, as condições de vida são o resultado de uma interação dos distintos elementos naturais, trabalhados pela atividade humana, com maior ou menor intensidade. Mesmo na Antártida, onde as condições inóspitas de clima dificultam o estabelecimento permanente do homem, as marcas de sua atividade estão presentes no buraco da camada de ozônio que altera as condições naturais do continente gelado.
        Porém, independentemente da ação humana, podemos afirmar que as paisagens são também produtos das mais diversas combinações de fenômenos naturais, que apresentam sua própria diversidade, a exemplo do relevo, que aparece em distintas formas e dimensões. Essas formas diferentes de relevo contribuem para criar diferentes paisagens de montanhas ou planaltos.
        Por sua vez, as condições climáticas são determinantes para a diversidade das formações vegetais e para o processo de formação dos solos. O clima também está presente nos distintos agentes de erosão, a exemplo das chuvas ou do vento.
        Por isso, também é responsável pela modelagem do relevo. Assim, os diferentes processos físicos e biológicos interagem mutuamente na formação do que se chama substrato natural da paisagem.
        Por causa das atividades humanas, a paisagem natural vai sofrendo múltiplas modificações no decorrer do tempo, transformando-se numa paisagem humanizada, pela incorporação de elementos culturais.
       De acordo com a atividade predominante da população de um lugar, vão se estruturando paisagens de diferentes características, segundo os graus de transformação dos elementos naturais, e conforme a intensidade e a orientação da atividade humana. Desse modo, podemos diferenciar paisagens agrícolas, minerais, industriais e urbanas.
      O maior impacto das atividades humanas está presente na paisagem urbana, que é o produto de atividades ligadas à indústria, ao comércio e ao serviço. Isso mostra que a paisagem não é dada para todo o sempre, mas que é objeto de mudança permanente.