sábado, 25 de julho de 2009

Análise2: O FASCISMO NO BRASIL

O FASCISMO NO BRASIL

Introdução

A proposta deste trabalho é analisar as características da política econômica no Brasil no período de 1930 a 1945, ou seja, após a Revolução de 1930 e principalmente durante o Estado Novo, e verificar se há aspectos da forma fascista de exercício do poder, movimento fortemente presente no cenário político mundial naquele momento.
Começo descrevendo alguns pontos que caracterizam os movimentos fascistas. É bom lembrar que embora se fale sempre no modelo alemão (nazismo), ou no italiano para caracterizar o fascismo, este movimento se apresenta em variadas formas – e por isso uso aqui o termo no plural “fascismos” – , que muitas vezes passam desapercebidas ou são negligenciadas pela historiografia.
Entendo como fascistas os movimentos nacionalistas extremistas, hierarquizados e autoritários, que tinham como aspectos fundamentais o seu caráter antiliberal, antiparlamentar e anti-socialista; o organicismo social; a liderança carismática e a negação das diferenças.

As Formas Fascistas

Nos anos de 1930, os movimentos fascistas haviam se espalhado como uma resposta à crise do liberalismo.
A primeira característica destes movimentos é o nacionalismo, que se apresentava com a busca de elementos (raízes) nacionais e até mesmo raciais (tendo o caso alemão como exemplo extremo) para legitimar o movimento como sendo um defensor de uma suposta coesão nacional contra uma ameaça de desagregação. Neste ponto entra também a questão da negação das diferenças e as ações e discursos voltados para o mercado interno.
O caráter antiliberal se dava através de acusações de que o liberalismo era o que proporcionava a desagregação, já que suas idéias originadas durante o iluminismo propunham a autonomia dos indivíduos e a destruição das instituições tradicionais. Isso, segundo os movimentos fascistas, acabava por desfazer os laços de identidade desses indivíduos, enfraquecendo a noção de ordem e hierarquia.
O caráter antiparlamentar se dava com a crítica as partidos políticos. Com o grande número de partidos, estes teriam apenas interesses de setor e de classe, portanto parciais e não-nacionais. Com isso, o que era ação, tornava-se debate. O poder que é o exercício da ação por excelência, quando passa a ser exercido por esferas através de conchavos, trocas e barganhas, reconhece sua limitação e passa a ser um não-poder, destinado a impotência.
O caráter anti-socialista, ou antimarxista, se dava com a crítica à divisão de classes. Se os fascismos defendiam um Estado onde haja coesão nacional, este Estado não pode ser dividido em classes antagônicas. O marxismo era visto então como um desagregador da ordem nacional, e por isso devia ser combatido.
Passo agora a falar sobre as propostas dos movimentos fascistas.
Em oposição a essa desagregação social causada principalmente pelo liberalismo, os fascistas propunham o Estado orgânico. Ou seja, o funcionamento da sociedade era visto em comparação a de um corpo biológico, onde o Estado é um todo coerente, no qual cada parte tem sua função e trabalha em solidariedade com as outras. Essa harmonia seria baseada nas tradições nacionais. Eliminam-se assim as contradições internas.
Como única forma de alcançar a unidade entre povo e Estado, os fascismos propunham como princípio de liderança o estabelecimento da autoridade de cada líder, assim como a obediência para com cada um, dependendo do nível hierárquico. Com este princípio, o Estado conduzido por um líder tem autoridade ilimitada.

O Cenário Político no Brasil

Getúlio Vargas assume a presidência do Brasil pela primeira vez em novembro de 1930, mesmo tendo perdido as eleições, através de um movimento revolucionário. Vargas era o candidato da Aliança Liberal, formada pela oligarquia de Minas Gerais e os estados que se opunham a São Paulo.
A oligarquia paulista reage acusando o governo Vargas de autoritário e promove a Revolução Constitucionalista de 1932. Apesar de derrotada, a luta paulista não foi em vão. Em 1934, diante do descontentamento, há uma Assembléia Constituinte, na qual se estabelecem alguns direitos e a criação de instituições, tendo como maior exemplo a Justiça Eleitoral.
Essas mudanças ainda não fizeram cessar as manifestações. O cenário político brasileiro está polarizado: de um lado a Aliança Nacional Libertadora (ANL), reunindo as forças de esquerda e liderada por Luís Carlos Prestes; de outro a Ação Integralista Brasileira (AIB), que divulgava os ideais fascistas e era liderada por Plínio Salgado.
Em meio a esse enfrentamento, Getúlio Vargas obtém cada vez mais apoio para conter os extremistas de direita e de esquerda. Em 1935 acontece o levante comunista, promovido pela ANL, que é dominado em cerca de 15 dias. O governo declara estado de emergência no país. Uma onda anticomunista se fortalece, apoiada também pela igreja, o que deu um caráter popular. Há também um forte apoio militar a Vargas. O Estado passa a perseguir seus adversários. Prestes é preso. O abuso de autoridade se dava até com prisões sem acusação.
Em 1937, já próximo das eleições, o Estado com um forte aparato e já praticamente sem resistências a seu mandato, instala um Golpe de Estado, fechando o parlamento e demais instituições, baseando-se num falso documento que anunciava um ataque comunista. Estava instalado o regime ditatorial denominado Estado Novo, e uma nova constituição é anunciada.
A partir daí, uma série de medidas estabeleceram uma nova fase de relação entre o Estado e o sistema político-econômico.
Desenvolveu-se um projeto econômico voltado para o mercado interno, que tinha como base à industrialização. Para isso era necessário alterar as relações de trabalho. Vários direitos trabalhistas foram reconhecidos, como a jornada de 44 horas semanais, férias remuneradas etc., resultando, em 1943, na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Estas medidas ocorreram devido à crise ocorrida com a Depressão Econômica Mundial (1929-33), onde a burguesia tomou consciência da vulnerabilidade de uma economia voltada para o mercado externo. Há neste período a ruptura política, econômica, social e cultural com o modelo de Estado oligárquico.
Ao mesmo tempo em que reconhecia os direitos sociais dos trabalhadores, o Estado negava os direitos políticos. Os movimentos trabalhistas eram duramente reprimidos e os sindicatos passaram a ser ligados ao governo.
Em 1940, o governo instituiu a Comissão Executiva do Plano Siderúrgico Nacional. Podemos ver com estes dois exemplos que o governo trabalhava voltado para os setores básicos da economia, pretendendo criar condições infra-estruturais para a emancipação econômica.
Essas atitudes atendiam as necessidades do capitalismo naquela época, porém também demonstram a tendência ao controle e disciplina, com uma condenação do liberalismo econ6omico, onde a regulação pretendida seria mais difícil.
“A constituição de 1937, por fim, outorgada pela ditadura instituída com o Estado Novo, sob Getúlio Vargas, manteve as mesmas diretrizes nacionalista e intervencionista (da Constituição de 1934). Foi entretanto, mais explícita, ao enunciar a possibilidade de atuação do poder público em qualquer esfera da economia.” 1

Todas essas ações, que aparecem explicitamente durante o Estado Novo, já vinham sendo colocadas em prática desde 1930. Uso como exemplo dois trechos de discursos proferidos por Getúlio Vargas. O primeiro de 4 de maio de 1931, onde os ideais aparecem em forma de propostas:
“Faz-se mister congregar todas as classes, em uma colaboração efetiva e inteligente. Ao direito cumpre dar expressão e forma a essa aliança capaz de evitar a derrocada final. Tão alevantado propósito será atingido quando encontrarmos, reunidos numa mesma assembléia, plutocratas e proletários, patrões e sindicalistas, todos representantes das corporações de classes, integrados, assim, no organismo político do Estado.” 2

O segundo é de 30 de novembro de 1938, onde a mesma idéia aparece como imposição, em tom autoritário:
“O Estado não compreende, nem permite, antagonismos de classes nem explosões violentas de luta; para esse fim, criou órgãos reguladores, que não só coordenam as relações, como dirimem divergências e conflitos entre as diferentes classes sociais." 3

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Temos então que embora houvesse no Brasil um movimento de caráter fascista – a AIB – quem aplicou a forma fascista de exercício de poder foi o governo Getúlio Vargas, explicitamente no Estado Novo. Tanto é assim, que a ditadura Vargas foi perdendo força ao mesmo tempo em que os outros movimentos fascistas no mundo eram derrotados.
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1 – IANNI, Octávio. “Política Econômica Nacionalista (1930-1945)”. Estado e Planejamento Econômico no Brasil (1930-1970). 3a. Edição. Rio de Janeiro. Ed. Civilização Brasileira. p. 46.
2 – Idem. p. 35.
3 – Idem. p. 35.

Neste breve ensaio, apesar do pouco material utilizado, mas de rico conteúdo, procure i mostrar alguns aspectos políticos econômicos implantados no Brasil pelo governo Getúlio Vargas comparando-os as formas gerais de dominação dos movimentos fascistas.
Trabalhar este tema e fazer esta afirmação é complicado no caso brasileiro pelo fato de que, no Brasil, ao contrário dos países europeus, tivemos que passar por várias reformas ou transições de ordem cultural, política, econômica etc. ao mesmo tempo, por conta da ânsia de modernização baseada em moldes importados ao mesmo tempo em que se mantinha uma mesma elite. Isso possibilitou que um governo, mesmo num regime autoritário, conseguisse apoio popular através do reconhecimento de direitos básicos.
Outro ponto a se levar em consideração é a variação da forma brasileira do exercício de poder que, apesar das características muito semelhantes aos dos movimentos fascistas do mundo, tinha um governo diplomático, mantendo relações com diversos países de regimes diferentes. Isso vai contra a tendência em pensar os movimentos fascistas como o caso alemão, o que este trabalho também procurou mostrar é que os fascismos podem aparecer de cariadas formas.

Júlio Canuto é estudante de Ciências Sociais






BIBLIOGRAFIA UTILIZADA:
IANNI, Octávio. “Política Econômica Nacionalista (1930-1945)”. Estado e Planejamento Econômico no Brasil (1930-1970). 3a. Edição. Rio de Janeiro. Ed. Civilização Brasileira. p. 13-71.
SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. “Os fascismos”. O Século XX – o tempo das certezas – revoluções, fascismos e guerras. REIS FILHO, Daniel Aarão; FERREIRA, Jorge e ZENHA, Celeste (Org.). Rio de Janeiro. Ed. Civilização Brasileira. p. 109-164.

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